Fogo e formas, Ana Sérgio

Texto de Ana Sérgio e João N.S. Almeida.

Começamos este dossier com uma achega semi-poética a dois fundamentos dessa essência a que chamamos erotismo. Por um lado, o fogo, uma das quatro substâncias originais postuladas na antiguidade, é caracterizado pela intensidade e brevidade. De facto, o erotismo é sempre, necessariamente, breve: não existem cerimónias eróticas que durem continuamente dois dias ou dois anos — excepto no caso de uso de meta-anfetaminas ou no caso de alguns animais que copulam durante longos períodos de tempo, mas tais eventos excepcionais parecem pertencer mais ao capítulo da aberração e não merecem aqui enumeração substancial. 

O fogo apega-se à matéria, e, na verdade, dá-lhe uma forma que ela antes não tinha. Uma poça de petróleo, grotesco e sem contornos aferíveis, levanta-se numa ode ao desejo, à ascensão e à criação visual quando nutrida de fogo.

Por outro lado, a forma, mais do que a matéria, é que convida ao impulso do erotismo. É sabido que copos cheios de fluidos sexuais, ou garrafões, ou contentores, não entusiasmam ninguém. Mas basta um vislumbre de uma forma para ativar a imaginação, tanto que até existem pessoas que encontram essa ativação em objetos inanimados, como veremos mais à frente.